Filme: Young Sherlock Holmes
Ano: 1985
Roteiro: Chris Columbus e Arthur Conan Doyle (personagens)
Direção: Barry Levinson
Produção: Steven Spielberg, Marck Johnson e Henry Winkler


domingo, 7 de abril de 2013

Capitulo 19 - A sessão

Pensei que enfim teria uma noite de sono tranquila, mas, mesmo exausto pelas noites anteriores, não consegui dormir. Rolei de um lado para o outro na cama e a insônia novamente tomou conta de mim.
- Não consegue dormir? – perguntou-me Holmes.
- Acordei você? Sinto muito, não sei o que está acontecendo comigo. Já faz semanas que não consigo dormir direito. – suspirei.
- Apronte-se, vamos sair. – disse ele, se levantando.
- Aonde vamos? – indaguei, me levantando também.
- Você vai ver. – foi só o que me respondeu novamente.
Dei uma olhada em Ivy e a menina parecia dormir tranquilamente. Tranquei a porta do quarto por fora, já que Holmes havia me dito que retornaríamos antes do amanhecer.
Tomamos um coche após andarmos em silencio por alguns quarteirões.
- Então, como foi a sua investigação disfarçada? – tentei puxar uma conversa.
- Nenhuma novidade. Apenas fui descobrir a rotina dos três suspeitos, seus horários e os lugares que costumam frequentar. – contou-me.
- Pelo menos você tem três suspeitos; a polícia me parece que já desistiu do caso. – continuei.
- Na verdade, eu estou investigando apenas dois suspeitos. Só falta uma peça chave para descobrir qual dos dois é o assassino, e está peça chave está para chegar. – revelou-me.
Não deu tempo para eu perguntar mais nada porque o coche parou em frente a White House.
- O que viemos fazer no bordel? – não entendi.
- Não seja tolo Watson! O que você acha que homens fazem aqui? – riu da minha pergunta.
Entramos e sentamos no bar do enorme salão que estava lotado.
- Holmes, eu ainda não estou preparado para isso. – reconheci meio constrangido.
- Também tive muita dificuldade em aceitar que precisaria frequentar esse tipo de lugar. Mas enfim, mulheres são um mal necessário, e sua insônia, meu caro, é por causa da necessidade delas. Também já passei por isso. – confessou.
- Mary me faz muita falta. Acho que não vou conseguir ficar a vontade com outra mulher. – expliquei.
- Escolha uma. Que tal a latina? – provocou-me.
- Ficou maluco? Não vou ficar com uma mulher que já ficou com você. – indignei-me.
- Sinto em lhe informar, meu caro, mas já estive com todas as mulheres desta casa, com exceção da proprietária, é claro, devido a sua idade avançada. Não pense nisso Watson, elas estão aqui para atender qualquer cliente, inclusive Emanuela. Eu tenho um acordo com ela onde sou obrigado a ir a seu quarto sempre que venho aqui, mas posso dar um jeito nisso se quiser ficar com ela. – disse-me com naturalidade.
- Não! – decidi com firmeza.
Apesar de sentir-me atraído pela latina, havia algo que me impedia de pensar em passar a noite com ela.
- Então escolha outra. – ofereceu-me com paciência.
Olhei para as garotas ao redor e apontei com a cabeça para uma, sem mesmo olhar direito.
- Está bem, pode ser aquela.
- A novata? Melhor não. Ela não sabe nem se despir sozinha. É a sua primeira vez aqui, vai precisar de alguém mais profissional. – alegou.
A latina nos encontrou bebendo no bar do salão.
- Holmes! – se aproximou ela, muito sedutora.
- Emanuela, por favor, me chame a Caroline. – pediu ele.
- Só depois que subir comigo. – disse ela quase cantando.
- Não é para mim, é para o meu amigo. – esclareceu.
- Já volto. – saiu ela, depois de me dar um sorriso de enfeitiçar qualquer um.
Holmes tirou de seu casaco uma pequena e delicada caixa e me entregou; pensei que tivesse dinheiro dentro.
- Eu posso pagar! – rapidamente o repreendi.
- Eu sei. Isso é "luva de vênus", Watson! Aprenda a sempre ter uma no bolso. Nunca se sabe quando vai precisar. – aconselhou-me.
Coloquei a caixa de preservativos no bolso com cara de quem não sabia se realmente deveria estar ali.
- Não se preocupe com nada e apenas diga a garota que você quer o serviço completo. – avisou-me.
- O que é o serviço completo? – indaguei.
- Você vai saber. – sorriu-me.
Emanuela se aproximou acompanhada de uma morena muito bonita.
- Doutor, está é Caroline. – apresentou-me.
- Doutor! – disse-me a jovem muito sedutora, estendendo-me a mão.
Holmes pagou a conta do bar, me olhou transmitindo confiança, pegou a mão de Emanuela e saiu em direção à escada para o segundo andar.
Eu aceitei a mão da senhorita que também me conduziu para a escada.
Chegando ao quarto, fiquei completamente tímido. Apesar de toda minha experiência com mulheres, era uma situação muito estranha.
Criei coragem e disse à jovem que queria o serviço completo, conforme meu amigo havia me ensinado.
- Deite-se! – disse-me, me empurrando para a cama.
O tal serviço completo é impossível de descrever. Caroline fez coisas que senhoras casadas nem ousariam sonhar.
Precisei de um bom tempo para me recuperar, depois que a garota terminou o tal serviço. Paguei e disse-lhe um obrigado muito constrangido.
- Espere que volte! – respondeu-me com doçura.
Desci a escada nas nuvens.
Olhei pelo salão e não vi meu amigo. Voltei a me sentar no bar e pedi uma bebida. Para minha surpresa, a latina veio se sentar comigo.
- Tubo bem Doutor? – sorriu-me linda.
- Sim, Holmes já foi? – perguntei a ela.
- Não, terminou comigo e já subiu com outra. É a maneira dele demonstrar que não é só meu. – contou-me com naturalidade.
Não sei porque, mas fiquei surpreso.
- Eu o conheço há tanto tempo, e ele ainda consegue me surpreender. – comentei com ela.
- Ele não fala sobre sua vida pessoal, mas qualquer um percebe que há uma amizade muito forte entre vocês dois. – observou ela.
- Somos como irmãos. Às vezes temos nossas brigas, mas não demora e logo estamos juntos aprontando alguma coisa. Nossa cumplicidade é muito forte e ele é a pessoa que mais confio e admiro. – confessei-lhe.
- Ele é muito especial! – suspirou ela.
- E ele também é estúpido com as mulheres. – tive que admitir, já que ela sabia muito bem disso.
- Não na cama. Ele é o homem mais gentil e encantador que já conheci. – confidenciou-me.
Fiquei de boca aberta com a revelação. Ela percebeu minha surpresa e pareceu-me ter se arrependido de ter me contado.
- Por favor, não comente com ele sobre o que eu lhe disse. O Doutor deve saber o quanto ele não gosta que falem de sua intimidade. – pediu-me.
- Não vou falar. - sorri para ela.
- Doutor, perdoe-me por perguntar, mas o senhor sabe quem é Elizabeth? - indagou-me.
- Por que me pergunta? - quis saber.
- Holmes, às vezes me chama por este nome na intimidade, mas ele nunca quis me contar nada sobre ela. - confessou-me.
- Este assunto é muito doloroso para ele. Elizabeth  foi a namorada de Holmes quando éramos adolescentes. Ela morreu assassinada e me parece que ele nunca a esqueceu. Ela foi a única mulher que Holmes amou. - contei à latina.


- Então é nela que ele pensa quando esta comigo. - suspirou Emanuela. 
- Eu pensei que, com o passar dos anos, meu amigo fosse conseguir superar a perda dela e se apaixonar de novo. Mas a verdade é que ele é obcecado por ela e não se permite ter outro relacionamento. É como se ele quisesse se guardar para ela. E acredito também que ele não queira se envolver novamente com outra mulher e colocar a vida dela em risco, afinal, Holmes é um caçador de bandidos e assassinos. - expliquei.
- Eu não me importo em quem ele pensa e nem com quantas outras mulheres ele se diverte. O importante são os momentos que ele passa comigo. Na vida que tenho, aprendi que o amor pode ser livre. - sorriu-me encantadora.
Holmes chegou de surpresa.
- Cuidado com o que falam, o assunto chegou. – brincou ele.
Era muita prepotência da parte dele achar que eu e Emanuela só poderíamos estar falando sobre ele; o pior é que era verdade.
- Emanuela, ainda está estudando aquele livro sobre espíritos escrito por um francês? – perguntou ele.
- Sim, é um livro incrível. – respondeu ela.
- E neste livro tem alguma coisa sobre espíritos que ficam aparecendo neste mundo? – perguntou.
- Aonde quer chegar, Holmes? – indagou Emanuela, achando que era uma brincadeira.
- Eu e o Watson temos visto uma mulher muito etérea, que já nos apareceu inclusive como uma imagem no espelho. – esclareceu ela.
- Eu sei que é muito estranho, mas também acho que estamos vendo um fantasma. – confirmei.
- Não há nada de estranho em ver espíritos, Doutor. Eles estão entre nós e basta ter uma certa mediunidade para percebê-los. – explicou-nos.
- E porque será que essa mulher está aparecendo para nós dois? – continuou Holmes.
- Só ela pode responder! – afirmou à latina.
- E como ela poderia nos responder? – perguntou meu amigo.
- Podemos tentar entrar em contato com ela em uma sessão espírita. – sugeriu Emanuela.
- E você saberia fazer essa tal sessão? – solicitou ele.
- Posso tentar. Se vocês já a viram, é possível que também possam entrar em contato com ela. – esclareceu ela.
- O que será preciso? – questionou meu amigo.
- Apenas um lugar muito tranquilo. – respondeu a latina.
- Muito bem, eu volto para combinarmos a tal sessão. Até mais Emanuela. Vamos Watson. – despediu-se Holmes.
Despedi-me da latina e segui com meu amigo para a praça, onde tomamos uma carruagem de aluguel, que nos levou de volta a Baker Street.
- Não está pensando em fazer esta sessão em nosso apartamento? – adverti.
- Não se preocupe, não faria uma sessão dessas com aquele “meio quilo de gente” por perto. Vamos fazer na casa onde tenho meu laboratório. – esclareceu ele.
Aproveitei para contar a Holmes minha conversa durante a tarde com a menina, quando ela me pediu para deixá-la ir embora. Meu amigo tentou me convencer de que Ivy estava escondendo algum segredo.
Em nosso apartamento, destranquei a porta do quarto da criança e dei-lhe um beijo na testa, após observar que ela dormia como um anjo.
Bastou me deitar na cama para que eu também dormisse profundamente; foi uma noite como há muito tempo eu não tinha.
Acordei tarde e logo me assustei ao me lembrar de que Ivy poderia estar com Holmes. Vesti-me e corri para a cozinha onde só encontrei a criada.
- Saíram os dois, Doutor. Senhor Holmes disse que levaria a menina para conhecer seu laboratório. – contou-me a criada.
Meu coração quase parou. Sai correndo para a rua a procura de um coche. Não queria nem pensar no que meu amigo poderia estar aprontando com a criança.
Chequei à sua mansão e já na entrada me deparei com a criada olhando para o telhado. A menina, mesmo de vestido, estava escalando por ele, seguindo Holmes.
- O que está acontecendo? – perguntei à senhora.
- Ele disse que iria ensinar a menina a arrombar janelas. Isso é coisa que se ensine a uma menina? – reclamou a criada.
- Ivy, desça já daí! – gritei lá de baixo.
A menina me sorriu e continuou subindo. Os dois conseguiram descer à janela do segundo andar da mansão, onde Holmes deu seu canivete à criança e parecia estar lhe explicando como arrombar a janela.
Entrei na casa e corri para o quarto do segundo andar. Quando cheguei, os dois já tinham conseguido entrar.
- Nada mal. Tem razão Watson, ela aprende rápido. – disse-me meu amigo com a maior calma do mundo.
- Holmes, pelo amor de Deus, o que está fazendo? Ela é uma menina! – critiquei.
- Dedução brilhante, Watson! Ela está aprendendo tão bem quanto qualquer outro menino de rua que já ensinei. – justificou-se ele.
- Eu sou melhor que eles. – intrometeu-se Ivy, muito presunçosa.
- Terá que me provar, minha cara. Vamos ao laboratório. – convidou Holmes.
- Nada disso, vou levá-la comigo. – confrontei.
- O Doutor não manda em mim. – contestou ela.
- Não é só você que tem coisas para ensiná-la, Watson. Eu também tenho meus conhecimentos que podem muito bem serem úteis a ela. – argumentou meu amigo.
- Eu imagino a utilidade para uma menina saber arrombar uma tranca. – impliquei.
- Não seja chato! Depois eu é que sou machista. – disse-me ele, saindo com Ivy para o laboratório.
Voltei para a sala sem saber o que fazer. Se por um lado era bom vê-los se divertindo juntos, por outro, as lições de meu amigo criariam péssimos hábitos à Ivy.
A criada me serviu chá e me ofereceu o jornal. Sentei-me à mesa da sala de jantar, ao lado do laboratório, e tentei me convencer que tudo aquilo era só uma brincadeira.
Com o passar das horas fui me acalmando ao ouvir que meu amigo estava ensinando química à pequena, e ela parecia estar gostando. Mas foi só eu relaxar para se surpreendido por uma explosão no laboratório, que me fez cair da cadeira para o chão, com as pernas para o ar.
Holmes e Ivy saíram de lá tossindo muito, mas inteiros.
- Bom trabalho! – parabenizou ele à menina.
Ivy sorriu orgulhosa.
Lembrei-me de Mycroft me dizendo o quanto Holmes era uma influência perigosa para crianças.
Almoçamos os três juntos na mansão e o assunto entre os dois eram os elementos da tabela periódica.
- Conquistou uma admiradora, Watson. Sua aluna me contou que gostaria de ser médica como você. – comentou Holmes.
- É um desafio muito grande minha cara. São poucas as mulheres que conseguiram estudar medicina e nem a rainha aprova que elas tenham esta profissão. Mas se for o seu desejo, nós daremos um jeito. – dei-lhe meu apoio, feliz com a notícia.
- Senhor Holmes, o mensageiro que pediu está na sala. – avisou a criada.
- Obrigado. 
Meu amigo se levantou da mesa e se dirigiu a entrada da mansão, onde um jovem o aguardava.
- Por favor, entregue este recado neste endereço. Passe antes em um florista e leve flores também. – pediu Holmes, lhe dando o dinheiro.
- Que flores Senhor? – perguntou o rapaz.
- As que tiveram mais espinhos. – sugeriu meu amigo.
O jovem fez cara de quem não entendeu o pedido, mas saiu sem fazer objeção.
- Aposto que o recado e as flores são para a Senhorita Riley. – especulei.
- Exato, meu caro. Mandei-lhe um convite para jantarmos esta noite. Vamos ver se consigo descobrir algo sobre a misteriosa senhorita e seu “armário alemão”. – brincou ele.
Durante à tarde, ajudei meu amigo e a menina a limparem o laboratório parcialmente destruído pela explosão. 
Retornamos somente à noite para o apartamento, quando Holmes se aprontou muito elegante para o jantar.
- Tome cuidado! Não se esqueça de que ela é dissimulada e perigosa. – adverti.
- Mas continua sendo uma mulher. Por mais perigosas que sejam, podem ser facilmente enganadas. – sorriu ele - Vou precisar de sua ajuda Watson.
- O que quer que eu faça? – atendi prontamente.
- Preciso que leve Mingau amanhã cedo, por volta da seis horas, à casa da dissimulada e perigosa senhorita. – pediu-me.
- Vai usá-lo novamente para distrair os cachorros. – conclui.
- Elementar, meu caro. – confirmou-me, saindo para o encontro.
Não deu tempo para perguntar mais nada, mas se ele me pediu para levar o gato, é porque pretendia passar toda a noite fora.
Como eu sairia de madrugada e a criada só chegaria bem mais tarde, pedi a Ivy que dormisse no apartamento da Senhora Hudson; assim ela não ficaria sozinha pela manhã. 
Nossa vizinha, gentil como sempre, aceitou tomar conta da menina.
Perto da hora marcada, tomei um coche carregando Mingau comigo.
Ainda estava escuro e encontrei apenas a carruagem de meu amigo, em frente a mansão. Fiquei escondido do outro lado da rua, esperando que ele aparecesse.
A porta da mansão se abriu e Holmes surgiu acompanhado pela Senhorita Riley, que o levou até o portão. Eles se despediram com um beijo demorado; a mulher o agarrou pelos cabelos e parecia não querer mais soltá-lo.
Quando conseguiu livrar-se dela, meu amigo subiu em sua carruagem e partiu. Quando saiu de casa, na noite anterior, a carruagem estava sendo guiada por um cocheiro. Holmes deve tê-lo dispensado após o jantar, para passar a noite com a mulher.
Fiquei observando e a carruagem parou a alguns metros dali, enquanto a senhorita entrava em sua casa. Meu amigo retornou caminhando e eu fui ao encontro dele.
- Está se divertindo nesta investigação, não? – provoquei.
- Já fiz coisas piores. – suspirou, colocando Mingau no muro para atrair os cachorros, que estavam soltos.
A criada alemã surgiu para ver o porquê dos cães latirem tanto e viu o gato. Ela até tentou espantá-lo, sem conseguir.
Enquanto isso, eu e Holmes pulamos o muro do outro lado e entramos na casa pela porta deixada aberta, nos escondendo rapidamente atrás dos móveis da sala.
A criada entrou brava e subiu para o segundo andar, sendo seguida por mim e meu amigo. Vimos, escondidos no corredor, ela bater forte na porta do quarto da Senhorita.
- Vá embora e me deixe em paz. – gritou a falsa Senhorita Riley.
A criada abriu a porta com raiva e entrou gritando.
- O que você pensa que está fazendo, sua cretina?
- E quem você pensa que é para se intrometer na minha vida! – retrucou a dona da casa.
Olhei para Holmes e entendi o seu plano. Ele já havia me dito que arrumaria um jeito de fazer as duas brigarem para descobrir a verdade entre elas.
Aproximamo-nos da porta e ficamos ouvindo a discussão.
- Se não fosse por mim, você não teria a vida boa que tem. Fui eu que tirei você da rua, fui eu que matei os senhores desta casa e falsifiquei um testamento, e fui eu quem inventou a história de você ser filha deles. – berrou a criada.
- Você não fez isso por mim, titia! Você só me tirou da rua porque precisava da minha ajuda para matar e roubar a fortuna dos seus patrões. Já lhe dei a sua parte do dinheiro que roubamos. Por que não vai embora? – reclamou a Senhorita.
- Eu já lhe disse que você também terá que me dar muitas pedras da Turquia para que eu vá embora, e também porque tenho que impedir que você ponha tudo a perder e nos mande para a cadeia. Quantas vezes já lhe disse que esse homem é muito perigoso. E você foi tão estúpida a ponto de trazê-lo para dormir com você! O que disse a ele? Contou a ele que você era uma prostituta? – esbravejou a alemã.
- Óbvio que não! Menti a ele que eu estava muito fragilizada pela morte de meus pais e fui seduzida por um homem que me enganou prometendo casamento e depois me abandonou. Ele acreditou e disse não se importar. – contou.
- Idiota, ele só está usando você para descobrir alguma coisa sobre o cocheiro que matou aquelas pessoas. – confrontou a criada.
- E eu não sei nada sobre isso! Não há o que descobrir! – confessou à falsa Riley.
- Não vê o perigo que corre. Ele é o melhor detetive que existe! Ele vai acabar descobrindo o nosso crime. – insistiu a alemã.
- Ele é o homem mais incrível que eu já conheci e é muito rico. Ele é forte, enorme... passei a noite mais feliz da minha vida nos braços dele e serei capaz de qualquer loucura para me casar com Sherlock Holmes. – suspirou a bandida.
- Se formos descobertas, eu juro que mato você! – ameaçou a tia.
- Por que os cachorros estão latindo desse jeito? – berrou a senhorita, irritada.
- Tem um gato lá fora. Vou pegar a espingarda para mata-lo. E não pense que a nossa conversa terminou aqui! – resmungou a alemã.
Ouvimos passos vindos em nossa direção e saímos correndo em silêncio para a sala principal, onde nos escondemos novamente, já que a porta agora estava trancada.
A alemã passou carregando a arma, abriu a porta e foi até o jardim da casa.
Saímos rapidamente pela porta deixada aberta e pulamos o muro na hora em que ouvimos um tiro.
Pobre gato”, pensei.
Ficamos escondidos observando a criada pelo portão. Os cachorros pararam de latir e ela retornou para dentro da mansão.
Holmes foi em direção ao muro onde havia deixado o gato e, para minha surpresa, Mingau saiu pelo portão da casa vizinha, correndo para os braços do dono.
Caminhamos até a carruagem que Holmes havia deixado perto dali.
- Então a criada é tia da senhorita. Ela trabalhava para o casal Riley e, se aproveitando que eles estavam sempre viajando, inventou a história que eles eram muito doentes e tinha uma filha que só vivia para cuidar deles. – comecei a juntar as peças da história.
- Eles voltaram de uma viagem e foram mortos pela alemã. Ela forjou um testamento e conseguiu que a sobrinha recebesse a herança. – terminou Holmes.
- E você agora deu para passar a noite com uma cúmplice de assassino só para investigá-la – critiquei.
- É preciso sacrifícios para pegar criminosos. – brincou ele.
- Mingau que o diga! Senão tivesse sete vidas, já estaria morto. – ri do gato.
- Desvendamos um crime graças à investigação de outro. Mas acabamos de descobrir que elas não sabem nada a respeito dos assassinatos dos "sem cabeças". – constatou meu amigo.
- E o que vai fazer agora? – perguntei.
- Não precisamos mais delas; vamos entrega-las a policia. Vou mandar um recado a Lestrade para que nos procure. Ouviu o que o “armário alemão” disse a meu respeito? Sou o melhor detetive que existe! Que pena ela ser uma assassina, já estava me simpatizando com ela. – gabou-se ele.
Só pude rir do seu comentário.
Levamos a carruagem para a mansão de Holmes, onde os cavalos puderam descansar e seguimos para a Backer Street em um coche de aluguel.
Já em nosso apartamento, Holmes pediu que dois meninos de rua entregassem um recado para Lestrade e outro para Emanuela, marcando a reunião espírita para aquela noite.
- Acredita mesmo que vamos falar com um fantasma? – indaguei incrédulo.
- Você sabe muito bem que eu acredito em vida espiritual. E se nós conseguimos ver a mulher, porque não poderíamos falar com ela? – retrucou-me.
Nunca vi meu amigo se envolver com nenhum tipo de religião, e o mesmo chegou a me dizer algumas vezes que seitas religiosas não passavam reuniões hipócritas, onde as pessoas frequentavam por mera aparência. Mas Holmes não era ateu, e desde jovem me confessou sua crença em vida após a morte.
Depois do almoço, meu amigo saiu novamente para vigiar os sócios suspeitos. Desta vez foi disfarçado de velho.
Passou toda a tarde e nada de Lestrade aparecer. Eu estava encarregado de lhe contar tudo sobre o caso da falsa Senhorita Riley.
Holmes retornou à noite e novamente deixamos Ivy aos cuidados da Senhora Hudson, para irmos a sua mansão.
Ao entrarmos no coche de aluguel em frente ao nosso prédio, apareceram Lestrade e Gresgon.
- Rapazes, quase que não conseguimos chegar a tempo de encontrá-los. Perdoe-nos a hora, mas passamos o dia presos na sede da Scotland Yard dando explicações ao comandante. Precisamos de sua ajuda Holmes; temos que resolver o caso dos decapitados, da criatura que andou atacando na cidade e ainda precisamos encontrar o assassino do juiz com urgência. Nossas carreiras estão em perigo. – disse Lestrade desanimado.
- Carreira Lestrade? Só se for de múmia! Você já era para estar aposentado a milhares de anos. - retrucou meu amigo.
Lestrade mudou a expressão de angustiado para muito bravo.
- Por favor, nos diga que seu recado para o procurarmos significa que descobriu algo sobre algum destes crimes! – implorou Gregson.
- Subam, eu e o Watson estamos indo a um encontro. Conversaremos no caminho. – ofereceu meu amigo.
Holmes e eu nos sentamos em frente aos inspetores, que pareciam muito cansados.
- Sobre o caso da criatura, ela está morta. – informou meu amigo.
- Encontraram o bicho? O que era? Como morreu? – espantou-se Lestrade.
- Era uma coisa, digamos, desconhecida pela nossa ciência. Nós encontramos a toca da criatura e eu a matei. Foi um acidente, é claro. – contou Holmes.
- Explique esta história direito Holmes. – pediu Gregson.
- É tudo o que posse lhe dizer sobre este caso. Sobre o caso dos "sem cabeças", estou prestes a pegar o assassino, e sobre o caso do juiz... – meu amigo me olhou – bem, este será mais complicado de se resolver.
Entendi o seu olhar. O caso já estava resolvido, mas nunca revelaríamos aos inspetores.
- Mas não chamamos vocês por causa desses casos. Nós descobrimos outro crime. Quer contar a eles Watson? – pediu-me.
Passei a relatar aos policiais que havíamos descoberto os corpos do casal Riley enterrados no quintal da mansão, com buracos de tiros nos crânios, e que eles foram mortos pela criada alemã, que falsificou um testamento para que sua sobrinha, a falsa Senhorita Riley, se passasse por herdeira e recebesse a fortuna.
Eles quiseram saber a todo custo como havíamos descoberto toda a história, mas eu e meu amigo os convencemos de que não poderíamos revelar. 
Os meios usados para investigar não foram nada convencionais, como invadir a casa usando um gato, e ainda Holmes, tendo um caso com a Senhorita para lhe fazer brigar com a criada.
Paramos em frente a White House, onde apanharíamos Emanuela.
- Bem senhores, isso é tudo o que temos a contar. – finalizei a conversa.
- Vamos nos despedir aqui. – avisou meu amigo.
Emanuela subiu no coche, nos cumprimentando.
- O que vocês estão aprontando? – interessou-se Lestrade, percebendo algo de estranho no nosso encontro.
- Não é nada de mais, pode acreditar. – disse Holmes calmamente.
- Então não se importarão se formos juntos, certo? – Gregson se permitiu ser inconveniente.
Os inspetores nos olharam com desconfiança.
Eu e Holmes, pelo olhar, notamos que estávamos pensando a mesma coisa. Seria engraçado levar os inspetores para falar com fantasmas.
- O que acha Holmes? – perguntei rindo.
- Acho que podemos levá-los. Os inspetores me parecem homens abertos a novas experiências. – brincou ele.
- Quanto mais gente melhor. – conclui Emanuela.
A carruagem seguiu para a mansão de Holmes.
- E então, o que é esta tal nova experiência? – perguntou Gregson.
- Vamos fazer uma sessão espírita. – comunicou Emanuela.
- Sessão o quê? – estranhou Gregson.
- Comunicação com os mortos. – explicou ela.
- Estão de brincadeira? – assustou-se Lestrade.
- Absolutamente inspetor. Sou adepta do espiritismo, uma doutrina criada na França, e Holmes me pediu para fazer uma sessão espírita. – revelou a jovem.
Os policiais se olharam arrependidos de estarem ali.
Holmes e eu os observávamos com vontade de rir.
- Será que os inspetores ficaram com medo? – brinquei.
- Medo? Ora Doutor, eu não acredito nesta baboseira. – contestou Lestrade.
- Baboseira? Então quero ver se são homens de participarem. – provocou Emanuela.
- Vocês dois são malucos! – reclamou Gregson, enquanto eu e Holmes rimos.
Chegamos à mansão e Emanuela pediu a criada que colocasse sobre a mesa de jantar uma toalha branca e que trouxesse um copo com água.
A criada não entendeu o pedido e nos trouxe cinco copos.
- Não preferem tomar vinho ou licor? – perguntou-nos atenciosa.
- Não Senhora, é só um copo com água. Nós não vamos beber, vamos fazer uma sessão espírita. – esclareceu Emanuela.
A criada arregalou os olhos assustada e colocou o copo com água sobre a mesa.
- Vocês irão precisar de mais alguma coisa? – perguntou ela, falando vagarosamente com medo.
- Não, obrigado. Pode ser recolher e tenha uma boa noite. – respondeu gentil meu amigo.
Enquanto a criada se retirava, Emanuela colocou o copo com água bem no centro da mesa e, ao redor, organizou sequencialmente todas as letras do alfabeto, recortadas em papelão. Também apagou todas os candelabros da sala, deixando apenas uma vela acessa ao lado do copo.
Após sentar-se na cabeceira, a latina pediu que nos sentássemos, eu a seu lado e Holmes ao meu lado, enquanto Lestrade sentou-se do outro lado da mesa, ao lado de Emanuela, e Gregson ao lado de Lestrade.
- Deem as mãos e fechem os olhos. – ordenou à senhorita.
- Isso é realmente necessário? – não gostou Holmes.
- Façam o que eu mando! – retrucou ela.
Holmes e Gregson se esticaram para darem a mão sobre a mesa.
- Vamos pedir aos nossos guias que nos auxiliem nesta reunião... – começou ela.
- Nossos guias? E eu só lá carruagem para ser guiado? – estranhou Gregson.
- Fique quieto inspetor. Tem alguém aí? – indagou a senhorita, como se estivesse em transe.
- Tem eu! – respondeu Holmes brincando.
- E eu! – respondi também.
- Eu também! – disse Gregson.
Emanuela suspirou brava.
- Tem alguém aí, além de mim e desses quatro patetas? – refez a pergunta.
- Tem a criada lá nos fundos, morrendo de medo! – respondeu Holmes.

- Se continuarem brincando, não vai aparecer nada. - reclamou ela.
- Estou vendo um gnomo! – surpreendeu-nos Holmes.
- Onde? – Emanuela abriu os olhos para ver também.
- Do seu lado. Lestrade não é a descrição perfeita de um gnomo? – brincou meu amigo.
Eu e Gregson não conseguimos segurar o riso.
- Muito engraçado, Holmes. – esbravejou o inspetor.
          Emanuela suspirou muito irritada. Após olhar feio para todos na mesa, fechou os olhos tentando se concentrar.
- Tem alguma coisa no meu pé! – assustou-se Gregson.
- Almas de outro mundo só puxam os pés dos vivos quando estão na cama. – explicou Lestrade.
- E desde quando você entende de almas de outro mundo? – confrontou Gregson.
- Desde quando ele se casou com uma. A esposa de Lestrade foi a cobra da arca de Noé. – respondeu Holmes.
Caímos na risada novamente.
- Holmes, cale a boca. – Emanuela perdeu a paciência.
- Uuuuuuh! – falamos juntos eu, Lestrade e Gregson, admirados com a atitude da latina em repreender meu amigo.
- Repita isso e eu atiro a senhorita e os espíritos pela janela! – ameaçou ele.
Mal Holmes terminou de falar e um forte vento na sala apagou a luz da única vela acessa, nos deixando na completa escuridão. 
Gregson e Lestrade se assustaram tanto que gritaram como donzelas em perigo.
Eu e Holmes caímos na gargalhada. Peguei o isqueiro em meu bolso e me apressei em acender a vela novamente, enquanto meu amigo se levantou para fechar somente o vidro da janela por onde entrou a corrente de ar.
Emanuela permaneceu com a expressão séria, de olhos fechados.
Quando Holmes se sentou à mesa, pessoas estranhas vindo da sala de visitas entraram pela sala de jantar, se posicionando ao nosso redor.
Fiquei surpreso sem entender quem eram. Pareciam pessoas normais, umas trajando roupas elegantes e outras, roupas mais simples. 
Notei que meu amigo ficou muito sério, também observando aqueles intrusos, mas sem nenhuma intenção de perguntar quem eles eram. Já Gregson e Lestrade pareciam ignorar a presença dos estranhos.
Minha expressão confusa se tornou paralisada quando vi a mulher do espelho se aproximar de Emanuela. Ela parecia muito real e percebi que Holmes também a via.
Todos os estranhos, inclusive a mulher misteriosa, levantaram suas mãos com as palmas direcionadas ao copo, que passou a se mover sozinho.
Gregson e Lestrade arregalaram os olhos, também paralisados.
Emanuela se pôs a soletrar as letras, as quais o copo parava em frente.
Letra por letra, fomos formando a frase: “salvem minhas filhas”.
Eu estava entretido, observando o copo e a mulher do espelho, quando me assustei ainda mais com Holmes saindo abruptamente da mesa, correndo em direção à janela, fechada apenas pelo vidro.
Meu amigo a abriu e pulou para fora da casa.
Sem entender o que estava acontecendo, eu, Lestrade e Gregson saímos correndo atrás dele e também saltamos pela janela.
Chegando ao portão da mansão, pudemos ver e entender a atitude do meu amigo. Ele estava perseguindo um homem todo vestido de preto, com capa, chapéu e o rosto coberto por um lenço.
Corremos por alguns metros e o homem, bem a nossa frente, subiu em um cavalo que estava a sua espera. Era o mesmo animal que vimos na praça, no dia do sequestro de Ivy. No entanto, não encontramos aquele cavalo na cocheira da loja, no dia da apreensão da carruagem.
Holmes parou a minha frente, mirando a cabeça do bandido com seu revolver.
Ouvi um tiro disparado atrás de mim por Lestrade e tive a nítida intuição de que Holmes seria atingido; pulei sobre o meu amigo.
A bala realmente quase nos acertou, mas passou longe do homem de preto que conseguiu fugir.
- Obrigado, Watson! - disse-me Holmes, já em pé, me estendendo a mão para ajudar a me levantar.
Não sei se realmente aquele tiro o teria atingido, mas senti uma satisfação imensa por tê-lo protegido.
Eu e Holmes ficamos desconsolados observando o assassino desaparecer na névoa, quando Lestrade conseguiu chegar até nós.
- Tentou me matar, Lestrade? – perguntou meu amigo.
- Não sabe quantas vezes eu quis isto, Holmes, mas hoje não era caso. – confessou o inspetor, constrangido.
- Quem era? – chegou ofegante Gregson.
- O assassino dos "sem cabeças". Ele nos seguiu e se o motivo das mortes é a prática de rituais condenáveis por fanáticos religiosos, acabamos todos nós por entrarmos na lista das pessoas que ele vai querer decapitar. – revelou Holmes.
- Aquele cavalo, Holmes, é diferente do cavalo que vimos na praça. - observei.
- E o assassino estava nos seguindo Watson. Isto prova que ele sabe que estamos investigando os sócios e está trocando os cavalos para não nos deixar pista.
Voltamos para a mansão, onde encontramos Emanuela preocupada e sozinha. A mulher do espelho e os estranhos que vimos haviam desaparecido.
Holmes contou para todos que, quando acabamos de formar a frase, a mulher do espelho olhou assustada para a janela, fazendo com que ele visse o homem que nos observava lá de fora.
Gregson e Lestrade ficaram sem entender quem era a mulher do espelho, mas Holmes continuou explicando o perigo que agora todos nós corríamos.
- Emanuela, vou levar você para uma outra casa que tenho, a qual uso como esconderijo. Lá você estará segura até prendermos esse assassino. – decidiu meu amigo.
- Nem pensar Holmes, eu preciso atender meus clientes. – não aceitou ela.
- Você não entendeu o que eu disse? Você está correndo perigo de morte. – contestou ele.
- Se este assassino é um fanático religioso, não deve frequentar bordeis. Então ele não sabe quem eu sou e não saberá onde me encontrar. – argumentou ela.
- Não sabemos desde quando ele está nos seguindo. Ele pode ter visto você entrar na carruagem em frente a White House. – insistiu ele.
- Eu sei me cuidar Holmes e não vou deixar meu trabalho por causa de um fanático. – decidiu ela.
Meu amigo também ofereceu seu esconderijo para Lestrade, Gregson e para mim, e nós também recusamos.
Combinamos um plano para levarmos Emanuela em segurança para o bordel. Lestrade e Gregson foram com ela em um coche de aluguel, enquanto Holmes atrelou sua carruagem e fomos logo atrás deles, observando atentamente se havia alguém nos seguindo.
Os policiais deixarem Emanuela na White House e partiram, enquanto eu e Holmes, na carruagem, ainda permanecemos um tempo em frente ao bordel, vigiando.
 
Capitulo 20 - O monstro

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